Ética Engenharia - Prova pericial no âmbito minerário

A prova pericial no âmbito do direito minerário

Ações de avaliação e pesquisa

MARCELO CORRÊA MENDONÇA
ENGENHEIRO CIVIL PERITO JUDICIAL DIRETOR DA ÉTICA SERVIÇOS E ENGENHARIA

No estágio atual de evolução das sociedades humanas é impossível a satisfação das necessidades diárias da população sem a utilização dos recursos minerais, que transformados, permitem a produção dos mais diversos bens, equipamentos, ferramentas, veículos, aeronaves, navios, insumos para o agronegócio e construção civil, instrumentos hospitalares, dentre outros incontáveis produtos tão necessários a vida humana atual, que têm nos minerais o seu principal insumo de fabricação. Portanto, a mineração é base para quase todas as atividades industriais. Assim, por óbvio, os recursos minerais são estratégicos para o desenvolvimento econômico e social de uma sociedade, daí a necessidade de sua exploração e aproveitamento econômico serem regulados por legislação específica.

O Direito pátrio regula as questões decorrentes das relações econômicas, sociais e culturais do Brasil. Nos termos do art. 5º do Decreto 9.406/20181 as atividades de mineração abrangem a pesquisa, a lavra, o desenvolvimento da mina, o beneficiamento, a comercialização dos minérios pelo estabelecimento minerador e o fechamento da mina.


¹ Decreto 9.406/2018-Regulamenta o Decreto-Lei nº 227, de 28 de fevereiro de 1967, a Lei nº 6.567, de 24 de setembro de 1978, a Lei nº 7.805, de 18 de julho de 1989, e a Lei nº 13.575, de 26 de dezembro de 2017.

Art. 5º A atividade de mineração abrange a pesquisa, a lavra, o desenvolvimento da mina, o beneficiamento, a comercialização dos minérios, o aproveitamento de rejeitos e estéreis e o fechamento da mina


 

Um dos principais aspectos da mineração é que as reservas minerais são decorrentes da formação geológica na origem do planeta, portanto a localização é fator preponderante na mineração, o minerador tem que buscar o minério no local em que este se encontra. As atividades de pesquisa e da exploração propriamente dita só podem acontecer no local onde se situa a jazida.² Portanto, o minerador deve necessariamente explora-la naquele local, trata-se de rigidez locacional³.

Por ser a mineração um ramo estratégico e fundamental para qualquer nação organizada, na grande maioria dos países existe a predominância do interesse público sobre o privado. No Brasil não é diferente, para que ocorra exploração dos recursos minerais de acordo com o interesse maior da sociedade, o público prevalece sobre o privado. No Decreto 9.406/2018 existe previsão expressa do interesse nacional e utilidade pública como fundamentos da atividade mineral (Art. 2º). Portanto, mesmo contra o interesse do dono da terra, as atividades de pesquisa e eventual exploração de uma jazida podem ser exercidas em face da ordenação jurídica do Brasil.4

O Decreto 9.406/2018 em seu art. 3º estabelece que compete à união organizar a administração dos recursos minerais, a indústria de produção mineral e a distribuição, o comércio e o consumo de produtos minerais.5


² Art. 6º Decreto 9.406/2018 Art. 6º Para fins do disposto neste Decreto, considera-se:
I – jazida – toda massa individualizada de substância mineral ou fóssil, que aflore à superfície ou que já exista no solo, no subsolo, no leito ou no subsolo do mar territorial, da zona econômica exclusiva ou da plataforma continental e que tenha valor econômico;
³ Art. 2º Decreto 9.406/2018
4 O Decreto – Léi 227 de 28 de fevereiro de 1967, regulamentado pelo Decreto 9.406 de 12 de junho de 2018.
5 Decreto 9.406/2018
Art. 3º Compete à União organizar a administração dos recursos minerais, a indústria de produção mineral e a distribuição, o comércio e o consumo de produtos minerais.
Parágrafo único. A organização inclui, entre outros aspectos, a regulação, a disciplina e a fiscalização da pesquisa, da lavra, do
beneficiamento, da comercialização e do uso dos recursos minerais. (Parágrafo único acrescido pela Medida Provisória nº 790, de
25/7/2017)


Diz o parágrafo Único do art. 3º, que a organização inclui, entre outros aspectos, a regulação, a disciplina e a fiscalização da pesquisa.

O interessado em realizar pesquisa em determinada área do território nacional deverá ser: brasileiro, sociedade empresária com sede no Brasil ou Cooperativa. Deverá pleitear à Agência Nacional de Mineração – ANM, em requerimento que deverá conter os elementos de instrução constantes do art. 16 do Decreto-Lei nº 227, de 1967 – Código de Mineração e atender aos requisitos estabelecidos em Resolução da ANM.
Dentre a exigências do art. 16 consta o plano de pesquisa, que deve descrever os trabalhos de pesquisa. Esses trabalhos são a base para as avaliações da renda e do cálculo do valor da indenização pelos danos. O interessado deverá apresentar memorial descritivo da área pretendida, planta de situação, cuja configuração e elementos de informação serão estabelecidos pela ANM que substituiu o antigo DNPM.

O Código de Mineração, em seu art. 27, garante ao titular de autorização de pesquisa a execução, dentro dos limites abrangidos pela outorga de pesquisa em terrenos públicos e privados, dos serviços necessários à pesquisa prévia, que deve ser realizada pelo minerador para verificar dentre outros aspectos técnicos, a viabilidade geológica e econômica da jazida. Em meio às principais atividades de pesquisa estão os serviços de sondagens, levantamentos geológicos, geográficos, físicos, químicos, escavações com a coleta de amostras para as análises especificas de laboratório, tais como de beneficiamento, aproveitamento industrial, teores de concentração do mineral, etc.

O detentor da outorga de pesquisa concedida pelo poder público, mais especificamente pela Agência Nacional de Mineração – ANM, também tem o direito de realizar as obras auxiliares necessárias para o desenvolvimento dos trabalhos de pesquisa. Essas obras auxiliares podem ser várias, dentre elas podemos citar, os acessos, escavações de poços de inspeção e furos de sondagens.

O art. 27 do decreto lei 227/67 garante ao proprietário ou posseiro da área objeto de pesquisa, o ressarcimento dos danos e prejuízos decorrentes desses trabalhos de pesquisa realizados em sua terra.6

Os danos correspondem às interferências físicas na propriedade que normalmente correspondem às aberturas de vias de acesso, derrubadas de matas e eventuais culturas existentes na área, implantação de praças de serviços, remoção de cercas e construção de alojamentos e pontos de apoio. Portanto, o pagamento referente a esses danos deve corresponder aos custos para a recuperação da área. Diz o inciso II do mencionado art.27, que a indenização pelos danos causados não poderá ultrapassar o valor da propriedade, na extensão da área atingida pelos trabalhos de pesquisa. Nos termos do inciso III do mesmo artigo, quando os danos forem de molde a inutilizar para fins agrícolas e pastoris toda a propriedade em que estiver encravada a área necessária aos trabalhos de pesquisa, a


6 Art. 27. O titular de autorização de pesquisa poderá realizar os trabalhos respectivos, e também as obras e serviços auxiliares necessários, em terrenos de domínio público ou particular, abrangidos pelas áreas apesquisar, desde que pague aos respectivos proprietários ou posseiros uma renda pela ocupação dos terrenos e umaindenização pelos danos e prejuízos que possam ser causados pelos trabalhos de pesquisa, observadas as seguintes regras:

I – A renda não poderá exceder ao montante do rendimento líquido máximo da propriedade, referido à extensão da área a ser realmente ocupada.

II – A indenização por danos causados não poderá exceder o valor venal da propriedade na extensão da área efetivamente ocupada pelos trabalhos de pesquisa, salvo no caso previsto no inciso seguinte.

III – Quando os danos forem de molde a inutilizar para fins agrícolas e pastoris toda a propriedade em que estiver encravada a área necessária aos trabalhos de pesquisa, a indenização correspondente a tais danos poderá atingir o valor venal máximo de toda a propriedade;

(…)V – No caso de terrenos públicos, é dispensado o pagamento da renda, ficando o titular da pesquisa sujeito apenas ao pagamento relativo a danos e prejuízos.

(…)”


indenização correspondente a tais danos poderá atingir o valor máximo correspondente ao valor venal de toda a propriedade.

A renda a ser paga ao proprietário da área objeto de pesquisa deve corresponder à renda que o dono ou posseiro do imóvel rural deixou de auferir enquanto os trabalhos de pesquisa eram realizados. Essa renda não deve ultrapassar à renda líquida máxima que seria obtida com a exploração da parte do imóvel onde se realiza a pesquisa, nos termos do inciso I do art. 27 do Código de Mineração.

Quando não há acordo entre o titular da outorga de pesquisa e o dono da terra, considerando-se que existe a prevalência do interesse público sobre o privado, abre-se a Ação de Avaliação e Pesquisa, para permitir ao titular da outorga o acesso ao terreno. Normalmente, as divergências com o dono da terra ocorrem em relação aos valores ofertados de renda e indenização por danos, pois o superficiário não pode se opor a realização da pesquisa, não obstante muitos resistirem.

Aberta Ação de Avaliação e Pesquisa, não havendo acordo, o Juiz nomeará um Perito para apurar a renda e valor dos danos causados à propriedade objeto da outorga de pesquisa. O Perito deverá ser um profissional técnica e legalmente habilitado.

A Perícia, nesses casos, se limita às áreas apresentadas no plano de pesquisa, que obrigatoriamente deve ser juntado aos autos, ou fornecido ao Perito. Sem esse referencial não há como realizar a Perícia, pois o Perito não terá conhecimento da área exata objeto de pesquisa, bem como das atividades que serão realizadas na propriedade. O Perito precisa conhecer todas as obras acessórias para a realização da pesquisa, tais como os acessos, aberturas de praças, derrubadas de matas, remoção de cercas, dentre outros, para analisar os impactos dessas atividades na renda da área de outorga de pesquisa, bem como dos eventuais danos causados pelas atividades em si e obras acessórias na área em questão.

Nos muitos anos atuando em pericias nessas áreas, já vimos de tudo, peritos que avaliam toda a renda da propriedade ao invés de somente aqueles referentes às áreas que são objeto de pesquisa incluindo as aéreas ocupadas na propriedade necessárias para viabilizar a pesquisa.

Outros, que avaliam os danos em valores superiores ao valor de mercado das áreas objeto da pesquisa 7 e alguns poucos que se metem a calcular o valor da jazida!

Na realidade, cumpre ao Perito analisar detalhadamente o plano de pesquisa, verificar todas as áreas da propriedade que serão utilizadas pelos responsáveis pelos trabalhos de pesquisa. Após identificar esses locais no campo, o Perito deve tão somente calcular os custos de reparação devido aos danos e as perdas de renda que o proprietário rural terá nesses locais que não poderá utilizar pelo tempo de pesquisa. A título de exemplo podemos citar, se o local é utilizado para pastagens, o Perito deve calcular o valor da renda perdida com a exploração dessas pastagens. Se o proprietário não estiver explorando o local, mesmo assim o Perito deve considerar os valores de arrendamento para terra nua na região, sempre tendo o cuidado de que os resultados de seu cálculo não ultrapassem o rendimento líquido máximo da extensão da propriedade a ser realmente ocupada.

No caso dos danos, temos que calcular todos os custos necessários para repor o terreno ao seu status quo antes do início dos trabalhos de


7 Nos casos em que não ocorreu a invialização do restante da propriedade para fins agropastoris.


pesquisa. Para exemplificar, custos para recuperar todos os danos ambientais causados, de replantio de eventuais culturas existentes e os lucros cessantes que o proprietário rural teria com a cultura original, até a época em que a nova cultura volte a produzir nos mesmos volumes da original. Aí, temos dois aspectos diferentes e importantes, a renda e os lucro cessantes, a renda corresponde ao rendimento líquido da cultura durante o período de pesquisa e os lucros cessantes, às safras perdidas ou volume menor de produção até que a nova cultura volte a produzir como a original.

Quando os danos forem de tal ordem que inviabilizem para fins agrícolas e pastoris toda a propriedade em que estiver encravada a área necessária aos trabalhos de pesquisa, o valor calculado a título de indenização pelo Perito do Juízo para os danos não poderá ultrapassar o valor venal de toda a propriedade.

Portanto, diante das peculiaridades técnicas do tema, conforme sinteticamente exposto nesse breve artigo, o Perito que vai atuar em uma Ação de Avaliação de Renda e Danos de Pesquisa, deve conhecer as especificidades técnicas decorrentes da aplicação da legislação pertinente atualizada.

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